14.11.08

Dia de Sorte

Caramba, funciona, funciona!
Um frio na barriga me veio em condição oposta à temperatura do motor. Lugar esmo, estrada pouco movimentada, umas vacas ali parecem rir de mim. Respirei fundo, inútil, continuei desesperada. Celular não pega, abri o capô, não saiu fumaça: bom sinal. Não devo estar tão ferrada, ah, sei lá, o que que eu faço? Alguém deve parar pra me ajudar, mas uma mulher sozinha... Ai meu deus, e se for um estuprador, assassino, delinqüente... Ahhh, deixa de ser medrosa! Vai lá, vamo ver esse motor, não foi a água, eu coloquei no posto antes de pegar estrada, óleo, meu irmão trocou. Bem, acabou minha cultura em mecânica, vou colocar o triângulo ali e esperar uma boa alma.
Parou um caminhão, saiu um senhor meio barrigudo, um pouco careca e baixinho... Fiquei feliz, se ele for um tarado eu posso correr mais do que ele.
- O que aconteceu moça, o carro deu problema?
Eu devo estar parada aqui por diversão, né? Pensei maliciosamente.
- É moço, o carro não quer pegar, mas o motor não aqueceu tanto, o óleo tá em dia, tem água também, não sei o que pode ser...
- Deixa eu ver – Enfiou a cabeça no capô olhando com tanta concentração pra aquelas peças que eu não tinha a mínima noção do que faziam. – Seu carro é a gasolina?
- É sim moço. – Pensei: e faz diferença?
- Vamo aproveitar a ladeira e tentar pegar no tranco. Tem que ter cuidado porque tranco pode quebrar o dente de uma engrenagem do câmbio e também pode encharcar o catalisador. Você senta aí no volante engata a terceira marcha com o pé na embreagem e aí liga, quando o carro tiver andando tira o pé da embreagem e torce pro motor funcionar.
Fingi que entendi tudo, mas só entendi a parte de senta, põe na terceira, pé na embreagem, liga e tira o pé da embreagem. O carro até funcionou, mas apagou 30 metros pra frente do ponto que pegou. O moço coçando a cabeça falou:
- É a parte elétrica, um mecânico resolve fácil, deve ser um cabo que saiu do lugar, não quero mexer pra não arriscar piorar a situação. Pensei, quer saber, tou ferrada mesmo e até atrasada pra uma reunião em Brasília. Ele não mexe, mas eu mexo só me mostrar onde é. Depois se não der certo eu chamo o mecânico.
- Quer saber moço, o senhor não mexe, mas eu mexo e se não der certo depois o mecânico resolve, vamo lá, onde fica?
- A moça tem certeza?
- Ué tenho!
- Bem, deve ser um desses cabos. – Todos eram da mesma cor, que sem graça, nem dá pra escolher...
- Humm, tem um solto, aqui... Onde prega?
- Nossa, eu não vi esse cabo, deve ser esse moça, que sorte.
- Então prega ele aí, vou testar.
Cruzei os dedos com a chave na ignição. Tava louca pra sair daquele lugar, o frio na barriga não passava, mesmo tentando simpatizar com o caminhoneiro barrigudo.
- Pronto, moça, testa aí.
O carro pegou, senti um dos maiores alívios da minha vida comparável aos de teste de gravidez negativo.
- Moça, a senhora tá indo pra onde?
- Pra Brasília.
- Eu acho que não vai mais dar problema até lá, mas se der alguma coisa tou atrás da senhora na estrada.
- Muito Obrigada, nem sei como agradecer...
- Uma ave-maria tá bom.
É bom saber que ainda tem gente boa no mundo, pensei isso por uns 100 km, até que um buraco e “Puta que pariu”, furou meu pneu. Dia de sorte...

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