28.4.15

Maio

Faz mais frio em maio. Ao menos aqui, onde moro. Se não fizesse, eu não usaria calça e a Bebel, com dois ou três meses, não escalaria as minhas pernas e eu não teria tantas marcas de unha. (Se fizesse calor, eu ainda beberia aquele uísque, que mais parecia água suja). Pelo frio, talvez, a Bebel pegou o costume de dormir debaixo do edredom, colada a mim. Eu, muitas vezes, acordava assustado, cego de sono, atado a sonhos, acreditando ter esmagado a gata. Nunca consegui afastá-la desse risco. Hoje, o meu desespero se repetiu: toquei-a, sacudi, e ela abriu os olhos, aparentando confusão. Retornamos a nossa pesada tranquilidade.

Sinceramente, não me recordo bem de maio. As lembranças que tenho são dos meses anteriores. Em março, se não me engano, cheguei a minha casa e me deparei com uma caixa de papelão, bem no meio da sala. Foi como conheci a Bebel. Não sabendo nada de si, dei o nome de Haiany. Mudou – claro – porque aquela coisinha já havia sido nomeada. Mais tarde, descobri algumas semelhanças entre a humana e a felina. O tal uísque veio antes do filhote, com a Haiany. Se um chegou em março, o outro chegou em fevereiro; ou no mesmo mês, no início e no fim; ou março e abril. É certo que não estavam juntos nem a bebida veio depois. A Haiany me fez duas visitas, antes da Bebel, e passamos algum tempo distantes. Daí, quando vinha a minha casa com mais frequência, a Bebel era Bebel, não Haiany, e já tinha parado de aromatizar o meu quarto com urina. Nesse período, era maio; se não era, então junho, e ainda fazia frio. O que posso precisar de junho é o meu aniversário, o qual passei sem gente ao redor. Não me recordo, no entanto, como foi o dia.

De maio, só tenho certeza do aniversário da Haiany. Mesmo não dando parabéns a ninguém, por cansaço da repetição, enviei-lhe a imagem de uma cabra, na qual se lia: "Happy Birthday". Recebi algo similar, no meu dia.

Era só para lembrar do frio de maio, que se estende aos outros meses, pois hoje, que ainda não é maio, precisei vestir camiseta e calça para dar de comer aos cães. Um ano atrás, eu reclamava dos lábios rachados; porém o frio é pior no peito. Não racha, todavia faz sombra à vista, às ideias, como se uma névoa de gelo circulasse as veias.